Posso dizer que minha relação com a Odontologia foi um caso de amor à segunda vista. Apesar da escolha pelo curso não ter sido a minha intenção inicial, durante os 5 anos de faculdade fui me apaixonando pelo meu futuro ofício, sentia prazer em descobrir como sanar e prevenir os problemas bucais. Após percorrer toda a estrada da graduação,estava pronta para entrar no mercado de trabalho e tinha as expectativas e sonhos que a maioria tem assim que conclui esta etapa.
Deparei-me basicamente com as seguintes opções de trabalho:
1)montar um consultório comprando os equipamentos ou alugando turnos em salas já prontas; o que exigia um investimento financeiro inicial que eu recém-formada não dispunha;
2) tentar trabalhar para o governo através de um Programa de Saúde da Família; o ingresso num PSF teoricamente exigiria horas, dias, meses de estudos a fio, mas em geral não se trata de concurso público e sim do popular ” Q.I (quem indica)”, ou “pistolão”, sendo pré-requisito básico para trabalhar como membro da equipe ter uma espécie de “apadrinhamento” político, o que me deixava fora desta disputa;
3)estudar para disputar vagas de odontólogos em concursos em órgãos públicos; esta seria uma opção a longo prazo que adiaria os planos de começar a trabalhar logo;
4) fazer um mestrado e tentar enveredar pela área acadêmica; assim como a alternativa anterior implicava em não ter aplicabilidade imediata no mercado de trabalho, a não ser que não fosse dedicação exclusiva;além de exigir investimento fineceiro que na área da Odontologia não sai por menos de mil reis mensais.
5) prestar serviço para clínicas recebendo uma porcentagem sobre a produção; esta foi para mim a maneira mais oportuna, pois teria que fornecer a mão-de-obra, sem ter os custos operacionais de manutenção de um consultório como materiais, equipamentos e contratação de funcionários. A maioria das clínicas trabalha com o percentual de 60% para elas e 40% para os dentistas, mas já vi casos em que o dentista recebe 30, 35% da sua produtividade.
Diante de tantas formas de trabalho, é inegável que desemprego na Odontologia é difícil, mas muitas vezes o profissional depara-se com situações que colocam em xeque seu prazer em trabalhar e até mesmo a ética. Senti isso na pele quando recebi o convite para trabalhar em uma clínica popular no bairro da Lapa, em Salvador. No meu primeiro dia não tinha a agenda cheia de pacientes, diante da ociosidade, a dona do local me chamou para observá-la enquanto ela atendia os pacientes no box ao lado do qual eu trabalharia. Me deparei com tantas coisas erradas que não acreditava no que via! A dentista, se é que ela pode ser considerada uma profissonal na área de saúde, reaproveitava até mesmo materiais descartáveis. Fiquei praticamente em transe quando a profissional(?)usou um par de luvas em um paciente, lavou-o, ao invés de descartar e atendeu uma segunda pessoa com o mesmo material. Naquele momento senti uma grande frustração. Não imaginava como um ser humando era capaz de fazer isso com um semelhante e a sensação de impotência era muito forte. Achei que não cabia a mim passar um sermão na dita odontóloga,apenas me retirei do local e liguei imediatamente para a vigilância sanitária relatando o ocorrido.
Este tipo de situação é muito complexo, e fechar os olhos para algo tão grave seria inaceitável, me faria acreditar que no dia da colação de grau teria proclamado em vão o texto abaixo:
" Eu juro, / no exercício de minha profissão de
CIRURGIÃO DENTISTA,/ ser sempre fiel aos
deveres da honestidade,/ da ciência e da caridade,/
jamais me servindo da mesma para favorecer o
crime/ ou corromper os costumes /ou desmerecer
a Odontologia."
Esta é a parte introdutória do juramento dos futuros odontólogos.Seria válido que todos os profissionais remetessem ao momento em que se comprometeram a zelar pela profissão escolhida e levassem adiante o que foi prometido.
fuce.com.br
É Incrivé! Li seu texto e revivi um pouco da minha história!
ResponderExcluirA cada dia que passo fico cada vez mais aflita não só pelo meu futuro como também por nossos colegas que acabam descontando nos pacientes uma realidade que em 90% é provocada por nosso descompromisso em modificar o quadro atual da odontologia.
Me lembro como se fosse hoje: Uma antiga dentista minha perguntou: qual curso voce pretende realizar?Eu com toda garra respondi :ODONTOLOGIA! Ela olhou para mim e disse: o mercado está um pouco desajeitado...mas eu respondi prontamente: o amor é capaz de tudo!!!!
Bom ,hoje em dia mantenho minha dignidade e recebo meus pacientes como se fossem meus pais, porém sou uma profissional angustiada com o futuro que me aguarda.
Ainda nao desisti de ser DENTISTA, ainda tenho sonhos e projetos....
colega, espero que nao desista de nossa profissao - vamos nos unir para que o quadro de imoralidade, "prostituição",... que a odontologia se encontra seja modificado...
Quero deixar meu apelo: vocês que sao donos dos planos odontologicos que dominam o mercado tomem vergonha na cara de vocês ....Muitos são dentistas e sabem o gasto enorme que temos e ainda concordam com uma tabela miseravel!
Espero que continue escrevendo...acho seus textos agradaveis!